bipolar

24 July 2006

o dia amanheceu com receio

do caderninho da ana
Descobri contigo que o medo pode não ganhar sempre e que as palavras têm uma cor própria e que não há dois silêncios iguais.Há dias em que guardo as palavras cá dentro para não passar a outrem telas de tons escuros ou ruídos, mas perante as lágrimas tu sabes dizer o necessário para que sinta o teu abraço, perante as dúvidas sabes ser chão firme, e parar os meus tremeliques com um olhar doce e forte como um tronco de forte.
O conhecimento às vezes só provoca dúvidas e hipóteses e não há nada mais belo do que a crença.E perante os sustos tu agarras-me a mão, convidas-me para uma dança e com os teus olhos dás-me poemas e canções que mesmo sem sons audíveis são belas melodias para um dia tormentoso.
Há dias que trazem sustos mas tu guardas o castelo com um olhar sereno e restabeleces a paz:a Primavera acontece quando me dás a mão e ganho coragem e vontade de enfrentar chuviscos e trovoadas porque sei que zelas os meus passos a uma distância segura.
Há dias que trazem o medo escondido na aurora, mas o teu nome expulsa os feios monstros e como um exconjuro faz adivinhar um arco-irís para breve.
Em aflição chamo-te e tenho o teu olhar por escudo.Se fecho os olhos em pânico é a cor de mel que vem ao meu encalço e a ternura e meiguice valem mais que os mil compêndios.

14 July 2006

aprender tudo,devagar

do livro da ana(cont.)
No primeiro passeio aprendeu um novo mapa da cidade, lugares desconhecidos e ruas de que não sabia o nome eram agora roteiro daqueles dois e a cidade ganhava novo encanto porque em cada rua houve um abraço, ou promessa de beijo e tal alindava o espaço até então cinzento.Antes de darem as mãos, trocaram telefones para que não se perdessem mais e o tempo começou a contar do zero: antes de ti, agora contigo.Expulsou para a memória longínqua melodias e medos porque agora cabia-lhe inventar novas palavras e permirtir que nova banda sonora se criasse, devagar e sem receios. Aprendeu uma palavra mágica que afugentava o tédio e a tristeza: o nome dele.Começava uma história que podia fazer parte de um livro, mas que tinha um potencial maior: torná-la autora de uma vida feliz, poeta de palavras verdadeiras, criadora de possíveis mas de presente cheio e verdadeiro.
Aprendeu que tinham um caminho, que havia dia de amanhã, que vivia numa cidade mágica porque lá estava o seu tesouro e lá se faria princesa, e teria o seu castelo.Parece fantasia, mas esta história de encantar chegou-lhe na forma de um beijo longo e saboroso, daqueles que não mentem e que contados perdem metade do que foram pois são matéria de sonhar, que preenchem a alma ainda antes de haver palavras.
Aprendeu que "gosto de ti" tem a força de promessa e jura de sangue.E nesse dia soube que nascera, não fixou data pois dessa forma todos os dias pode celebrar aquele encontro que começou em tons de laranja e violeta num café cheio de fumo e barulho.À noite descobria-se no céu uma bonita Lua e ela soube que isso só podia ser um bom sinal.

11 July 2006

do livro da ana (again)

Apareceu com umas calças de ganga já muito usadas, balançava no andar com um estilo próprio e,conforme o combinado,vinha com uma flor na mão.O café ficou a parecer florista de tal forma afluiram jarros,camélias e malmequeres que,naquele dia e em resposta ao anúncio,eram b.i. dos candidatos e na forma e cor mostravam o gosto dos mesmos.Não valia comprar na loja,isso era ponto assente e assim o encontro ficava vedado aos incapazes de um risco, aos que aceitam a decoração alheia.Era obrigatório carregar uma história e querer contá-la.E chegar de mãos à abanar não dá muito jeito.
Ao contrário de outros,este empunhava uma violeta e um olhar firme que falava de forma eloquente, com o ritmo ondulado das incertezas de que se faz poesia."Senta-te aqui."disse-lhe ela sem mestria, sem ter palavras ensaiadas e temendo que a ordem parecesse autoritária,articulou baixinho como quem pede desculpa pelo atrevimento "se quiseres..."Imaginou no momento as epopeias passadas daquele que agora puxava a cadeira, mas preferiu que tais enredos fossem revelados devagar,saboreando o café e em passeios mil sem hora marcada para terminar."Não te apresses, tenho tempo."disse-lhe como elogio, porque soube que estava escolhido o herói.Na presença destes olhos o pôr-do-sol não carregava medos e dava vontade de acordar todos os dias para que os olhares entre si falassem em silêncios cheios de palavras que iam até à alma sem estarem gastos por bocas alheias e frases bacocas que se atiram para o ar só para encher vazios.
Gostava de amanhecer contigo,pensou e na altura podia apostar que ele lhe tinha lido o pensamento pois viu desenhar-se no rosto de tipo grego um sorriso latino que percebia bem, sem necessidade de tradução.